O crescimento atípico da modalidade emprego.
O crescimento atípico da modalidade emprego.
(Por Jadir Mauro
Galvão)
O crescimento econômico experimentado pelo mundo no período posterior a Segunda
Guerra Mundial em meados do Século XX, produziu uma explosão grandiosa de uma modalidade de trabalho conhecida
como emprego. Havia todo um Terceiro
Mundo[1] a
ser desenvolvido e todo um Primeiro Mundo[2] a
ser reconstruído. Grandes corporações europeias, algumas tantas asiáticas e um
bom punhado de norteamericanas experimentaram um excessivo (e anormal) aumento
em seus negócios. Era preciso iluminar e construir as cidades, pavimentar ruas,
construir novas rodovias, prédios... A rigor cidades inteiras precisavam de
trabalhadores, tanto na mão de obra operacional, quanto em sua camada
administrativa.
Mesmo a população mundial estava crescendo a olhos vistos. Era preciso
aprimorar a produção de alimentos e mesmo transformá-la em uma produção em
série como a indústria o foi no início do mesmo Século. Foi uma época de prosperidade para muitas empresas como Mannesmann, Siemens, Krupp, G&E, Komatsu, Honeywell,
Caterpillar, Saint-Gobain, Rhodia, Mitsubishi entre outras tantas das mais
diversas nacionalidades e ramos de atividade. Essas empresas necessitavam de engenheiros,
economistas, administradores, químicos, contadores e mais uma quantidade
significativa de auxiliares nessas tantas áreas e em outras mais.
Mais adiante, com o uso dos computadores para facilitar na administração
e controle dos negócios espalhados pelo mundo afora e ainda controlados
centralizadamente em suas matrizes, uma nova legião de programadores, analistas de sistemas e digitadores, entre outros precisava de formação e eram contratados a
alto preço pelo mercado de trabalho.
Mesmo as cidades se transformaram rapidamente. Vários bairros na cidade
de São Paulo tiveram seu inicio como vilas operárias ao redor de grandes
indústrias. Penha, Tatuapé, Água Branca e outros tantos cresceram ao redor de
indústrias de alimentos, químicas, farmacêuticas etc. No interior de São Paulo
temos a cidade de Votorantim, cidade homônima da indústria que deu origem e
forma para a cidade toda.
A demanda por profissionais formados, treinados e especializados também
norteou não só o ensino chamado superior como o ensino médio e fundamental que
passou a focar seus esforços menos na formação geral de um cidadão e muito mais
pensando em produzir mão de obra apta a compor esse que ficou conhecido como mercado de trabalho. Nesse mercado valia
ainda a lei da oferta de da procura.
Profissionais mais raros eram disputados com salários mais atraentes.
Sazonalmente a academia formava um contingente de engenheiros, agrônomos e esse
contingente acabava deflacionando o mercado tornando essa mão de obra mais
barata. Por vezes faltavam formandos em química ou contadores e as remunerações
subiam. Muitos escolhiam o que estudar na faculdade mais pelo valor pago no mercado e sua demanda, do que por seus próprios talentos e vontades pessoais. Eu
mesmo trabalhei com inúmeros engenheiros frustrados que tiveram de reconduzir
suas carreiras para a tecnologia, pois a engenharia, ou não tinha demanda suficiente
ou porque a remuneração não era atraente.
Eram demandas da indústria, do comércio, dos serviços em quantidade tão
grande que essa modalidade específica de trabalho chamada de emprego, sobretudo
com as leis trabalhistas regulando as relações e protegendo os trabalhadores
de eventuais abusos de empresas, que uma
modalidade de trabalho chamada emprego acabou por se transformar em quase seu sinônimo.
As palavras Emprego e Trabalho eram facilmente substituídas de uma para outra
sem que se perdesse o sentido de uma frase dita ou escrita. Mais de uma geração
nasceu, viveu e prosperou dentro desse fenômeno e a cultura não fez conta de
tratar emprego e trabalho como sendo uma coisa só e a mesma..
Mas em todo esse tempo as corporações buscavam e mesmo demandavam seus
gestores a uma racionalização da administração. Eufemismo para enxugar
o número de trabalhadores tanto operacionais quanto administrativos. Desde que
se compreendeu que não era aumentando o preço que se conseguiria ganhar da
concorrência ou mesmo lucrar mais, mas sim reduzindo os custos com matéria prima
e mesmo cortando as gorduras da administração, muitas medidas foram tomadas com
esse fim. Metodologias, processos, reengenharia, downsizing, terceirização foram objetivos
perseguidos com afinco. Automação, informatização e mais recentemente a dita
inteligência artificial vem cumprindo esse papel de reduzir os custos com mão de obra não especializada.
Isso poderia ser visto com bons olhos, pois nos pouparia de trabalhos
tanto mecânicos quanto enfadonhos. Trabalhos que qualquer máquina ou computador
poderia realizar liberando o homem para atividades mais genuinamente humanas.
Mas é ai que a substituição de emprego em trabalho mostra sua face mais
medonha. O que poderia ser a libertação do homem para a realização de
atividades mais humanas acabou por se transformar em desemprego.
Culpa-se a crise, a sazonalidade, a economia, os desgovernos e a migração
pelo assustador fantasma do desemprego. Legiões de trabalhadores compondo
índices de desemprego, subemprego e mesmo desalento em todo o mundo ao mesmo tempo em que
tantos trabalhos poderiam ser realizados e não são. Nesse ponto é que
precisamos recuperar a distinção entre os termos trabalho e emprego. O atípico
crescimento de uma modalidade de trabalho durante um certo período histórico não pode
restringir nossa potencialidade de realização e de trabalho. Mas acabamos por
deixar de lado outras modalidades de trabalho e mesmo não nos dedicamos a
pensar em novas.
A chamada Nova Economia gera demandas de trabalho para motoristas,
anfitriões, cozinheiros e outros. Mas ainda queixa-se da instabilidade e mesmo da falta das
leis que regulem. Não há que se ficar na dependência de empresas ou plataformas que nos
demandem atividades, mas sim de tomarmos a dianteira e pensar em novas formas
de trabalho. Não necessariamente nos tornarmos empreendedores, muito não tem
tino para tal, mas em repensar nossa atividade e mesmo nossa vida em sociedade.
Difícil reverter a inclinação da qual fomos formados, ensinados e
direcionados. Difícil perceber que a linha tracejada das nossas perspectivas,
sonhos e planos não é mais viável. Dura afronta é a realidade que se apresenta
diferente da que imaginamos. Mas é em tempos difíceis que nascem novas possibilidades.
Mas não é o caso de deixar para que alguém pense ou decida o que temos de
fazer, mas sim de tomar a dianteira e inovar, criar para além do que nos foi
proposto. Para além do que está legislado. Para além do que já foi pensado.
[1]
Terceiro Mundo era a nomenclatura dada à época mencionada para considerar os
tantos países, sobretudo do Hemisfério sul do planeta. Em contraste com o Primeiro Mundo, o dos países ricos do Hemisfério norte. Hoje chamamos de países em
desenvolvimento.
[2] Primeiro
Mundo destruído justamente pelos efeitos da Grande Guerra.
Comentários
Postar um comentário