De doenças invisíveis.
Nossa sociedade se desabituou do invisível. Jogou-o na conta do ilusório,
do fingimento, do mito no seu pior sentido, do não científico, do irreal, numa
palavra: do inútil. Por outro lado, esse mesmo invisível nos acompanha mesmo que
despercebido e por vezes nos assombra. Falemos agora de um dos invisíveis mais
cruéis: as doenças. Muita comoção e disposição são aguardados quando de um
acidente que deixa um rastro de sangue ou uma fratura exposta. Uma úlcera, uma
hepatite, uma pedra nos rins e até mesmo uma gripe mais forte são compreendidas,
mas tudo isso é visto, ouvido e sentido. São coisas visíveis, tratadas como
fatalidades da qual o doente é vítima e na acepção da palavra paciente. Mas hoje somos assolados por
inúmeras doenças que não são físicas. São doenças emocionais, mentais, e não se
acredite que estamos falando de loucura, mas sim de falta de sentido de muitas
coisas. Mesmo doenças espirituais, quando a própria vida parece não fazer
sentido. Mas dessas somos considerados pejorativamente agentes e não pacientes.
Isso acaba por produzir no doente certa dose de culpa que o sobrecarrega
com um fardo dispensável. A desesperança, a aflição e a angústia; a confusão, o
desnorteamento e a falta de sentido não podem ser tratadas com remédios
físicos, alopáticos. Não são doenças do físico, mas do corpo emocional, mental
ou até espiritual. Mas isso não significa que requereiram menor cuidado. Mas
nossa medicina objetiva não tem dessas, conhecimentos adequados, tampouco
tratamentos. Mesmo a depressão e a ansiedade são tratadas, no mais das vezes,
apenas no seu âmbito físico deixando seu principal de lado. Não sabemos que
ajuda pedir, não sabemos que conselho dar. Nos apegamos a religião, quando não
as drogas. Alguns, dotados apenas de sua percepção física podem alegar que
nenhuma dessas doenças ocorre em quem lava um tanque de roupa ou racha uma
lenha, mas quando não percebidas ou quando não cuidadas podem emergir em
doenças físicas.
Não me peçam a prescrição de medicamentos, tampouco de tratamentos
eficazes. Mas no geral o próprio paciente acometido de tais males tampouco
almeja por isso. Quem sabe não seja a doença que precise de cuidados ou de
maior atenção, mas sim o doente. Talvez seja um meio de conseguir a atenção, o
cuidado, o amor, o abraço. Arriscado oferecer tudo isso somente para o
tratamento da doença tornando-a necessária. Melhor repensar nossas prioridades
cotidianas que deixam para lá devido a atribulação diária, outros invisíveis
como o amor, a amizade, o cuidado a atenção mesmo quando não se fazem
visivelmente necessárias.
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